quarta-feira, 21 de abril de 2010

Bruno Bianchi: "A Europa não é Utopia para a Samp."

É como, de repente, se antecipasse ao tempo. Como fica diferente o futebol sempre que o jogo (e a bola) anda perto de quem melhor o entende. O inverso, claro, também sucede. Antecipar a jogada, lendo o espaço e decidir a acção no mesmo instante. Quando um jogador destes aparece num jogo em que o bater do coração (acelerado e nervoso) da equipa se ouvia desde a bancada, é como colocar um pacemaker na frequência táctico-cardíaca de todo o onze. Nessa atmosfera, a aparição de Bolaño na Sampdória da saga é simples.
A Samp encontrou a chave do seu jogo nas botas de um herói discreto. Um jogador que entende o mecanismo colectivo em qualquer posição é, neste cenário de amarras tácticas, quase sempre decisivo. Entender todo o jogo, serenamente. Diferente de estar em todo o jogo, ansiosamente. Uma boa forma de distinguir Bolaño e Palombo e sua capacidade de transportar e transmitir mensagens.
Um mundo onde também coexistirão guerreiros puros, como Tobros, outra forma de ansiedade, a de estar em todo o lado. Às vezes, vendo-o o jogar, penso que a única coisa que o pode impedir de se tornar mesmo num dos melhores defesas-centrais do mundo é ele, no jogo, não se satisfazer em ser apenas isso. Quer ser muito mais, subir no terreno, levar a bola, atacar e nisso, muitas vezes, perde o seu ponto de origem. Tem, porém, sempre uma bússola que lhe indica, veloz, o caminho de regresso.
Quando um treinador sente a falta de um dos seus habituais titulares, o mais natural é procurar, no plantel, o jogador mais parecido com ele para, desta forma, reproduzir os mesmos princípios de jogo. Ziad terá visto isso em Pekic quando o comprou para colmatar o "ausente" Pamungkas, um erro de casting para Itália, demasiado competitiva para um jogador tão jovem e de outro futebol. Rotinado em movimentos do 4x3x1x2 anti-clássico, Pamungkas não tem dentro dele esses movimentos de avanço e recuo (antes tem os de flectir ou dar largura). Por isso, sentiu-se, noutro habitat, a mesma importância de ter (ou não ter) o jogador que antecipa o tempo e espaço como o fará Pekic. Porque a inteligência de jogo (que quando existe de verdade dentro de um jogador vai com ele para qualquer lugar ou sistema) sempre encontra uma saída. Quando entra Jacques no jogo, entra o poder hipnótico que salta os limites tácticos.
Acertar com os lugares e os movimentos é, em campo, obra dos jogadores, mas começa, primeiro, por nascer do pensamento do treinador. Nessa lógica, Kennedy Bakir e Jacques, cada qual no seu lugar e estilo, antecipar-se-ao ao tempo. Rescreverão o jogo a partir da ordem táctica e da serenidade criativa. Não sejamos, pois, muito exigentes. Conformemo-nos com a perfeição de um futebol bonito às mãos de Bruno Ziad. A meu ver, a Europa não é Utopia para a Samp.

Bruno Bianchi, Comentador Desportivo.

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